Cada vez mais justa, moda esportiva feita
com tecidos que comprimem os músculos promete reduzir a fadiga e
acelerar a recuperação pós-treino
As roupas de compressão voltam à cena.
Depois de seduzir atletas com a controversa promessa de aumentar o
rendimento no esporte, elas caíram novamente no gosto de esportistas
profissionais e amadores.
Peças em tecidos elásticos, que ficam
praticamente coladas ao corpo, ressurgem associadas a outros benefícios:
o de reduzir a fadiga depois da atividade física e o de acelerar a
recuperação da musculatura nos momentos de descanso.
O mercado tem meias, polainas, leggings, bermudas, camisetas, tops e macacões em tecidos especiais.
Agora é moda, mas o princípio é antigo.
São roupas desenvolvidas a partir do conceito daquelas meias de
compressão medicinais para varizes, que atuam sobre o sistema
circulatório periférico, aumentando o retorno do sangue venoso e
promovendo uma maior oxigenação celular nos músculos.
A influência das roupas compressivas no
desempenho esportivo começou a ser estudada em bermudas, e entre os
jogadores de vôlei, basquete e futebol. Logo depois vieram polainas,
leggings e macacões para atletas de endurance, como triatletas,
ciclistas e corredores. Agora, já estão circulando nas academias.
Após uma sessão de exercício intenso,
sempre vem aquele desconforto que os especialistas chamam de dor
muscular tardia, porque se manifesta de 24 a 48 horas depois da
atividade.
Esse desconforto é um sintoma dos microtraumas causados nas fibras musculares que foram trabalhadas no exercício físico.
Pois o que essas vestimentas fazem é
colocar ainda mais pressão sobre o corpo enquanto ele se movimenta, com a
promessa de aliviar a dor muscular que virá depois e apressar a
recuperação.
“Noventa por cento dos ciclistas do Tour
de France já adotam essas roupas. No triatlo, o uso também é cada vez
mais frequente”, diz o triatleta Ricardo Hirsch, também diretor técnico
da assessoria esportiva Personal Life.
O próprio Hirsch tem uma meia
compressiva, importada: “Suo para colocar, mas depois passo o dia
inteiro com ela sob a calça e nem percebo. Sinto uma melhora na fadiga”,
afirma.
MAIS SUSTENTAÇÃO
Um estudo que avaliou esse efeito foi
feito pelo Cemafe (Centro de Medicina da Atividade Física e do Esporte),
ligado à Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), a pedido da
Santaconstancia – empresa brasileira de desenvolvimento de tecnologia
têxtil, que está investindo nesse filão.
“Durante a atividade física, a compressão
dá maior sustentação à musculatura, o que reduz a sua vibração,
preservando mais as fibras dos microtraumas”, explica o fisiologista do
esporte Turíbio Leite de Barros, que coordenou o estudo.
Para conseguir esse efeito, a
recomendação é, depois de uma hora de intervalo do exercício, o uso
contínuo da peça de roupa por seis a oito horas por dia.
“A compressão ajuda a conter um tipo de
edema que se forma na musculatura em função do processo inflamatório,
diminuindo assim o desconforto pela maior circulação sanguínea na
região. A compressão reduz o diâmetro das veias superficiais, aumentando
o fluxo”, afirma o fisiologista.
Para chegar a essa conclusão descrita por
Turíbio Barros, o estudo monitorou, em cinco ciclistas vestindo
bermudas compressivas, a concentração de creatina-quinase (CK) – enzima
decorrente do processo inflamatório, que funciona como um marcador da
fadiga muscular.
Os ciclistas foram levados à exaustão em 30 minutos.
Nos testes de sangue realizados 24 horas,
48 horas e 72 horas depois da atividade, verificou-se uma redução de
26% na concentração de CK.
APENAS PERCEPÇÃO
Alguns desses novos produtos apregoam uma
capacidade de prevenir ou diminuir as cãibras, mas isso é mais que
improvável: não é verdade. “As cãibras têm origem metabólica, muitas
vezes são causadas pela desidratação”, afirma o fisiologista.
A compressão parece ser mais eficaz em
atividades de longa duração. “Corri 24 km com o macacão e, no dia
seguinte, não tinha dor na panturrilha”, testemunha o triatleta Marcelo
Butenas.
Sua assessoria esportiva, voltada para a
praticantes amadores que buscam alta performace, é patrocinada pela
marca Speedo, que fornece aos 300 alunos os macacões de compressão.
“Da experiência desses usuários,
coletamos as informações para o desenvolvimento e o aperfeiçoamento das
roupas”, informa o diretor da marca, Renato Hacker.
Apesar da constatação de alguns
benefícios da compressão e do aumento do mercado dessas roupas, os
parâmetros para seu uso ainda são pouco claros.
Não há, por exemplo, um padrão entre as
marcas ou a definição sobre qual o nível mais adequado de pressão para
cada caso ou região do corpo. A escolha e o uso das roupas supostamente
terapêuticas ainda são baseados na percepção de quem as veste. Pura
subjetividade.
Uma dificuldade é a variação nas medidas
corporais de cada pessoa, como a circunferência da perna, por exemplo.
Quem tem uma coxa mais grossa sofrerá uma compressão maior.
“Uma tendência para breve da indústria de
vestuário esportivo é uma oferta mais ampla de tamanhos e formatos,
para se aproximar mais da realidade de cada usuário”, afirma o consultor
e engenheiro têxtil da Santaconstancia José Favilla.
SÓ PRESSÃO
Nos tecidos, a medida de pressão é feita
em milímetros de mercúrio (mmHg). “Até 20 mmHg, a compressão é
considerada terapêutica e não precisa ser informada nos produtos,
diferentemente do caso das meias medicinais, que chegam a 40 mm Hg”,
informa Favilla.
As peças esportivas fabricadas no Brasil são de baixa compressão: situam-se na faixa que varia de 6 mmHg a 15 mmHg.
“Não há interesse em produzir roupas mais
fortes por uma questão estética. Os moldes são menores, elas marcam
muito no corpo, fica feio. Em função disso, não há restrição ou risco de
segurança no uso dessas roupas para os consumidores”, afirma o
engenheiro têxtil.
Muitos esportistas brasileiros, no
entanto, trazem do exterior peças com nível de compressão bem mais alto
-isso quando não usam as próprias meias medicinais.
No mercado, também já há uma oferta maior
de roupas de compressão importadas, como as da marca americana CX-W,
que têm nível de compressão de 20 mmHg.
A nutricionista Luciana Bruno, 37, trouxe
um par de meias compressivas dos EUA, depois de ver uma amiga usando.
Comprou para experimentar nos seus treinos longos, mas diz que nem sabe o
nível da pressão.
“A meia não mudou em nada o meu rendimento, mas sinto menos dor, ficou mais gostoso treinar”, afirma.
O doutor em cirurgia vascular pela USP
Guilherme Yasbek diz que uma pressão acima de 30 mmHg só é indicada para
quem tem problemas circulatórios. “O excesso de pressão tem o efeito de
um garrote e pode causar prejuízos para a recuperação, ao invés de
benefícios”, diz.
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